Imagine o seguinte cenário: você precisa enviar uma grande quantidade de água por um longo cano até uma cidade distante. Se a água ficasse oscilando de um lado para o outro dentro do cano (como a corrente alternada faz), parte dela seria perdida no caminho, causando grande desperdício. Qual a solução para essa situação? Uma infraestrutura que torna o caminho da água uma corrente contínua, sendo assim, chegaria ao seu destino com muito mais eficiência, mesmo com distâncias enormes. Esse fluxo contínuo é como funciona o sistema de transmissão de energia em HVDC (High Voltage Direct Current), ou Corrente Contínua de Alta Tensão.
A tecnologia HVDC envia eletricidade por longas distâncias com uma “corrente constante”, ao contrário da corrente alternada, que muda de direção várias vezes por segundo. Esse método reduz as perdas de energia e permite que grandes quantidades de eletricidade sejam transmitidas de forma eficiente. Assim, o HVDC conecta regiões distantes e permite que áreas com alta geração de energia — como parques eólicos ou hidrelétricas isoladas — transmitam eletricidade para grandes centros de consumo com muito mais eficiência e menor impacto ambiental.
Vamos entender como isso funciona? Confira quais são os principais benefícios e as aplicações que tornam o HVDC uma tecnologia de vanguarda para o setor de energia.
Como funciona o sistema de transmissão HVDC?
O sistema HVDC começa com a conversão da energia de corrente alternada para corrente contínua, o que ocorre em uma estação conversora de envio. Depois disso, a eletricidade é transmitida em alta tensão por longas distâncias através de cabos ou linhas de transmissão. No ponto de chegada, outra estação conversora realiza a conversão de volta para corrente alternada, permitindo que a energia seja integrada à rede elétrica de distribuição. O uso de corrente contínua em alta tensão reduz as perdas de energia ao longo da linha, tornando o HVDC altamente eficiente, principalmente em trajetos acima de 600 km de distância.
Benefícios do HVDC
Maior eficiência em longas distâncias: As linhas HVDC perdem menos energia do que as de CA ao longo de grandes distâncias. Isso faz da tecnologia a escolha ideal para transmissão entre regiões distantes, como a ligação entre países ou continentes, ou entre áreas de grande geração e centros de consumo.
Maior capacidade de transmissão: Comparado com a transmissão em CA, a transmissão HVDC consegue transportar mais energia pela mesma linha, o que reduz a necessidade de construção de novas infraestruturas, diminuindo, assim, o impacto ambiental.
Menores custos operacionais e de infraestrutura: A transmissão em HVDC requer menos torres e menos espaço, pois utiliza apenas dois condutores (ou mesmo um em algumas configurações), enquanto o sistema de CA geralmente precisa de três.
Redução de perdas por reativos: Em situações em que há grandes perdas de energia por geração de componentes reativos (energia que circula sem ser consumida), o HVDC é uma solução eficiente, pois sua transmissão minimiza esse tipo de perda;
Redução de perdas por harmônicos: Em casos em que a presença de harmônicos (ondas indesejadas que prejudicam a qualidade da energia) causa perdas significativas, o HVDC oferece uma alternativa de transmissão mais limpa e com menos distorção;
Transmissão entre sistemas assíncronos: A tecnologia HVDC é comumente aplicada em intercâmbios de energia entre sistemas elétricos assíncronos, ou seja, sistemas com frequências diferentes. Nesses casos, utiliza-se a configuração back-to-back, que permite a transmissão segura entre duas redes sem a necessidade de sincronização das frequências.
Conexões intercontinentais e inter-regionais: Uma das grandes vantagens do HVDC é que ele permite a interconexão de redes de CA de diferentes frequências, possibilitando que redes elétricas de países vizinhos se conectem e compartilhem energia, mesmo que operem em frequências diferentes.
Aplicações do HVDC
A tecnologia de transmissão em HVDC em ±600 kV no Brasil foi utilizada pela primeira vez no sistema desenvolvido para integração ao Sistema Elétrico Brasileiro da energia gerada pela usina hidrelétrica de Itaipu, cuja operação teve início na década de 1980. Este sistema foi projetado para transmitir energia elétrica ao longo de cerca de 800 km, conectando as estações de Foz do Iguaçu (retificadora, Paraná) e Ibiúna (inversora, São Paulo), permitindo a interligação entre os sistemas de 50 Hz do Paraguai e de 60 Hz do Brasil.
Em 2024, a Eletrobras, em parceria com a CET Brazil – subsidiária integral da State Grid Corporation of China (SGCC) – começou o projeto de revitalização deste sistema com um investimento de aproximadamente R$ 2 bilhões.
Outro empreendimento da State Grid, o sistema Graça Aranha Silvânia Transmissora de Energia (GATE) está em construção e será o 1º sistema bipolo de 800 kV para escoamento de energia limpa e renovável do território brasileiro.
Conectando as regiões Nordeste e Centro-Oeste, o projeto transmitirá energia solar e eólica geradas para o coração do Brasil. A partir daí, a energia é entregue para as distribuidoras para, então, chegar às instalações de consumo.
Desafios do sistema de transmissão de energia em HVDC
Apesar dos muitos benefícios, o HVDC também enfrenta desafios significativos. O custo inicial de instalação das estações conversoras é elevado, e a manutenção dessas instalações requer pessoal especializado. Além disso, a integração de tecnologias HVDC em redes de CA exige um planejamento cuidadoso para garantir a estabilidade da rede, já que o controle da transmissão de corrente contínua é complexo.
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